Ramalhete de violetas
A vida passa-se rápida. Não se espera a morte por isso a maior surpresa quando ela chega e sinto pena, muito embora a saiba certa. A última vez que escrevi, no blog, sobre a "minha" Serreta na sua festa, estava muito feliz que não fazem ideia, pese embora, a sempre curta visita. Naturalmente, fiquei preocupada, e sabia que esta visita ía agravar a saudade existencial.
"Morreu o escritor, professor José DIAS DE MELO, um homem que levou a sua vida a cultivar a literatura, a escrever prosa e verso e, sobretudo, a utilizar a baleação como tema apaixonado."
Li este desabafo e já li outros parecidos. Deixou "três dezenas de livros" para que permaneça vivo. No mundo há livros sempre vivos mesmo que o rosto adormeça na fria e dura terra eterna.
Este verão não fui ao Pico, para matar a Saudade dos parentes e de amigas de São Roque e Piedade. Na freguesia de Santo Amaro, onde passava férias, na minha adolescência e juventude, quando meus pais eram vivos, havia gosto, felicidade e alegria. Regressava com saudade e ansiava lá voltar.
Quando lá vou, não me esqueço de passar pela Igreja e pelo cemitério onde residem os restos da minha gente. Vou lá à procura de recordações, num encontro mudo. Já não se ouvem os gritos à minha chegada, nem o meu livro, «Serreta na intimidade» os trará. Ninguém permanece para sempre.
"Dias de Melo escreveu muito. Era a sua grande paixão. Acompanhava-o o gravador e o bloco de notas". E esse vício fez com que fosse reconhecido, elogiado, homenageado, recordado, eternizado. Todos os escritores têm uma história. É ela que fica guardada em palavras guardadas em páginas novas (de papel ou magnéticas). Uma máquina de escrever ou computador são peças onde os dedos tocam cantando o que a mente dita. É o espírito que rege os dias e os acontecimentos. Na minha prateleira gostava de um dos seus livros. Dele não tenho nenhum. Não tive tempo. Ai, se ele tivesse sabido do meu gosto pelo Pico, das reminiscências do passado e vivências do presente, teria gostado?! Não sei.
Todos têm o dia, hora e minuto últimos. Todos! Ninguém conhece a última... Aviso a toda a gente que tenho muita pena da partida sem retorno e de partir sem o livro dias e dias de calcorrear um teclado, cuja melodia obedece à batuta dos meus dedos ligeiros, correndo o que a mente me dita. Quanto mais triste estiver, melhor me sai o corridinho; quanto mais isolada me sentir, melhor me canta o vento... Oh! vento da minha alma que me dás inspiração, faz com que alguma calma volte aos dedos da mão. São os dedos que se mexem mas não me comparo a ninguém. Sou eu ouvindo e lendo o que dizem dos outros. Entristeço. "Dias de Melo não parava de escrever", escreve Ermelindo Ávila, na Vila Baleeira, 24 de Setembro de 2008, publicado no blog "Notas do meu retiro". Encontrei o artigo no "Planeta Açores", primeiramente. Quem morre não tem tempo para mais. O que deixa é o que se pode ler. Quem não deixa nada leva tudo. E tudo tem dois caminhos. Qual será o nosso?!
Sua "obra notável e rica de cultura e de saber" tem o bom caminho. Que uma delas venha até ao meu antes da curva perigosa.
Um livro é a herança que cada leitor tem. Às vezes, é de ouro, outras de prata. É o triunfo das horas passadas junto da paixão nata ou descoberta. Foi-se o livro de uma vida inteira abraçada ao mar... O autógrafo é a marca indelével do cunho feliz do escritor. Deste não tenho. Tenho alguns que me deram alguns escritores. A obra ganha valores sentimentais para além dos que lá constam.
Calheta de Nesquim sobressaiu e galgou o mundo na viagem do seu filho escritor, marinheiro.
O Professor José DIAS DE MELO, deixa-nos cerca de trinta volumes. A "Bíblia" do mar e da baleação, digo eu. Não o conheci pessoalmente, nunca falei com ele, não o li ainda. Vou lendo extractos dos seus livros e imagino o todo.
Setecentas e vinte e três palavras lidas foram escritas por Ermelindo Ávila. Este artigo tem a mesma contagem mas não é plágio.
Comoveu-me o ramalhete de violetas deixado pelo Amigo...
Angra do Heroísmo
2 de Outubro de 2008
Rosa Silva ("Azoriana")