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Açoriana - Azoriana - terceirense das rimas

Os escritos são laços que nos unem, na simplicidade do sonho... São momentos! - Rosa Silva (Azoriana). Criado a 09/04/2004. Angra do Heroísmo, ilha Terceira, Açores. A curiosidade aliada à necessidade criou o 1

Criações de Rosa Silva e outrem; listagem de títulos

Em Criações de Rosa Silva e outrem
Histórico de listagem de títulos,
de sonetos/sonetilhos
(total de 1006)

Motivo para escrever:
Rimas são o meu solar
Com a bela estrela guia,
Minha onda a navegar
E parar eu não queria
O dia que as deixar
(Ninguém foge a esse dia)
Farão pois o meu lugar
Minha paz, minha alegria.
Rosa Silva ("Azoriana")
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Com os melhores agradecimentos pelas:
1. Entrevista a 2 de abril in "Kanal ilha 3"

2. Entrevista a 5 de dezembro in "Kanal das Doze"

3. Entrevista a 18 de novembro 2023 in "Kanal Açor"

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Vivência de outrora nas trajetórias de agora

07.05.12 | Rosa Silva ("Azoriana")

Fecho a cortina do olhar e dou por mim envolta nos tempos infanto-juvenis. Depois dos rigores do inverno em que a humidade subia vertiginosamente ao ponto de escorrer água pelas paredes dos quartos de uma casa bem perto da serra, vinha o bem-aventurado verão suave e sem deixar grandes marcas de bronzeado. Só aconteciam marcas se a exposição solar fosse horas a fio e, mesmo assim, tinha de estar em local aprazível. O que volta em torrentes da lembrança são as horas que passava entre o abrir da tampa das caixas de madeira antiga (baú) e a porta com serventia para um quintal cuja saída para a canada se fazia por umas cancelas que se abriam de par em par, até que a tarefa de assoalhar estivesse cumprida.


Quase ao romper da aurora, já se sabia qual o percurso a seguir: tirar todas as roupas guardadas durante um ano e coloca-las sobre as paredes, cadeiras ou bancos, a jeito do sol tirar o cheiro mofento que abundava sobremaneira. O ritual era sempre o mesmo: limpar muito bem a caixa no seu interior e exterior para voltar a guardar as roupas após ganharem a lavagem e/ou assoalhamento de um dia inteiro, num espreguiçar satisfeito dando um colorido vistoso às paredes daquela canada e daquele quintal. Eu adorava a descoberta de vestes antigas que não me cabiam no corpo mas preenchiam o meu imaginário. Por entre mantas, cobertores, colchas, lençóis, tapetes, almofadas, corpetes, camisas, saias, blusas, aventais, casacos, gravatas, toalhas e as bolas de naftalina, havia sempre algo de novo ou algo estragado pelas nódoas encarceradas entre as tábuas húmidas e bolorentas.

Na volta ao aconchego da limpeza doméstica, e após dobrarem-se muito bem todas as peças frescas e impregnadas com um perfume do campo, recorrendo-se, muita vez, a quatro mãos para que se unissem muito bem as pontas dos lençóis, mantas e cobertores, tinha-se o prazer de ver o efeito mágico do sol que secava as roupas que se lavavam nas pias de pedra com recurso a paralelepípedos de sabão azul e branco cujo perfume era bem melhor do que o da atualidade.

Eu assistia e ajudava a todo esse trabalho que tinha de ser feito sob pena de todas as roupas se perderem caso não fossem arrecadar algum calor solar.

Como era lindo o estendal da roupa branca numa aldeia serrana. O verde dos campos florescia e o cantar das aves dava a melodia plena de prazeres sonoros. Nunca mais passarei por esses rituais longínquos, nem tão pouco irei ver ou irei ouvir a alegria dos que me rodeavam nessas tardes de um verão solene. Somente posso deixar registado vivências de outrora nas trajetórias de agora.

Rosa Silva (“Azoriana”)