É agora...
É agora que o ilhéu é mais ilhéu
Com o grito do vento
Goteira no rodapé
Da porta da alma
Da plumagem sedenta e opaca
De um céu escuro, tenebroso…
É agora o inverno da ilha
Que se acomoda ao xaile da palavra,
Ao chá da memória
E ao piso da sorte vazia.
É agora que as entranhas se entranham,
Que o riso se veste de lã
Que o olhar se quebra na solidez
De um recanto da vida.
E o velho olha a recordação;
O novo finge não perceber
A tormenta do agora
Enquanto a bainha da chuva
Fica acima do tornozelo
De um animal escondido.
É agora que a saudade impera
No silêncio da escrita fina
Delicadamente de basalto molhado
Pela cadência de tons sombrios.
E eu?! Eu choro por dentro
Numa tempestade de pensamentos
Que irrompem distraídos do temporal
Da rua, do caminho de ilhoa,
Olhando o seu olhar triste, lembrando a outra era,
De como ela era… A minha segunda mãe.
É agora que começa a nova criação
Num janeiro de dezassete (dia dezasseis) de sueste (*).
Rosa Silva (“Azoriana”)
(*) Da "banda" sueste, o vento carpinteiro, ou seja, daquela banda que, nos séculos XVI, XVII... Escarolava as naus que não conseguiam fugir da baía de Angra. Aliás, Angra, significa isso mesmo: âncora, porto de abrigo. (informação preciosa de um amigo)